sábado, 30 de junho de 2012

fora do alcance das crianças

a maior obra de arte:
o ódio
na carne.
ponta de ferro na tela
dez traços vermelhos e ela:
o foco
desviado.
o desespero da menina
o rasgo na pele fina
o fumarato de quetiapina:
a dor
adormecida.

quinta-feira, 28 de junho de 2012

apocalipse 48

o primeiro anjo tocou. caiu então sobre a terra uma chuva de pedra e fogo, misturados com sangue. a terça parte da terra se queimou. a terça parte das árvores se queimou. o que existia de verde se queimou.
a semana acaba antes da manhã de domingo. você tem exatas 48 horas para se redimir da ausência de nós. você tem exatas 48 horas para quebrar os vidros de florais manipulados com conhaque. você tem exatas 48 horas para enxugar as lágrimas da hipnoterapia. você tem exatas 48 horas para impedir o vício em benzodiazepínicos. se em 48 horas não houver redenção, vidros quebrados, lágrimas enxugadas e vícios impedidos, nós acabaremos e então eu estarei acabada.  eu sinto que eu não existo quando você não me vê.

terça-feira, 26 de junho de 2012

pesadelo no fim de tarde

abandono externo, escuridão interna. você me dizia que precisávamos dar um jeito em nós dois. você me dizia na nossa língua, você me dizia em francês. você me dizia publicamente que é preciso dar um jeito de chegar ao fim, porque o líquido negro sufocava o líquido branco. e eu chorava a humilhação de ser um líquido negro. e eu perdia a referência das coisas ao perceber que nada mais seria branco entre nós – que nada mais seria colorido dentro de mim. abandono interno, escuridão externa. o silêncio é branco dentro da sua cabeça azul. mas a invasão é negra.  a invasão é consistente. a invasão parece petróleo.  eu sou petróleo afogando a sua luz. eu sou petróleo sufocando a sua alma. um suspiro ao perceber que negro era o meu quarto – que negro era o meu cérebro.

domingo, 24 de junho de 2012

princípio da percepção

eu queria que você me olhasse da mesma maneira que um homem triste olha para uma mulher impactante. mas você me olha da mesma maneira que um homem alegre olha para uma mulher tola. pelo menos era isso o que eu achava até perceber que o seu rosto tem cor de transtorno e que os seus olhos são fundos de insônia e de preocupação. o seu olhar perturbador é triste. o seu olhar é desfocado, o seu cérebro é confuso e o seu coração é um eco do seu cérebro e dos seus olhos. você me olha da mesma maneira que um homem triste olha para uma mulher triste. nós poderíamos ser mais impactantes, mais alegres, mais tolos. mas nós somos tristes, transtornados, insones, preocupados, perturbados, desfocados e confusos. ainda assim, o seu sexo chama pelo meu fogo e o meu fogo chama pela sua fumaça. é tudo amor, não é?